TURMA DO PETRÓLEO

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domingo, 3 de março de 2013


'O homem está tão dependente de petróleo que não quer pensar em outras soluções', avalia Rachel

Bióloga defende investimentos em energias alternativas
Redação NNpetro - 
Ferrenha defensora da economia verde, a bióloga e doutora em química Rachel Ann Hauser Davis dá entrevista ao NNpetro e expõe seu ponto de vista em relação ao cenário energético mundial. Para ela, mais investimentos em energias alternativas deveriam ser feitos e que a larga utilização do petróleo se deve ao fato "da veiculação da imagem de que 'não podemos viver sem'".
Colaboradora do portal, Rachel publica toda quarta-feira textos com enfoque em saúde e meio ambiente. Com mais essa entrevista, o NNpetro reafirma o compromisso de ser um veículo imparcial, comprometido com a informação, democracia e diversidade de olhares. Somos um veículo de todos para todos.
1X) Os ecologistas condenam o petróleo e o gás, mas eles existem em todos os lugares: no plástico, maquiagem, asfalto, silicone, pneus, gasolina, diesel, entre outros produtos. No mundo, o transporte de alimentos, mercadorias e pessoas é feito essencialmente com a queima desses combustíveis. É realmente possível a vida sem petróleo? Você consegue enxergar os benefícios que esta energia traz para a sociedade?
Rachel Ann Hauser Davis – É claro que os benefícios existem, os transportes citados, por exemplo, foram extremamente importantes no desenvolvimento da nossa sociedade. Hoje em dia, esse tipo de produto é sim parte de nossa vida diária. Porém, amadurecemos (ou deveríamos ter amadurecido) o suficiente para perceber que a nossa dependência nesse tipo de produto será o nosso fim em alguns anos. Carros elétricos já são maioria, por exemplo, em muitos países da Europa. Por que não aplicar tecnologias, se não completamente verdes, ao menos mais sustentáveis do que as atuais, quando reconhecidamente afetamos o ambiente e a saúde humana e animal de forma extremamente negativa? O que impede o trem elétrico? Aviões elétricos já são uma realidade, por que não investir nisso? Protótipos de aviões com painéis solares muito mais potentes da nova geração, por exemplo, também já estão em fases de testes. O grande problema é o pouco investimento nessas áreas, devido ao pouco interesse de nos livrarmos da dependência de combustíveis fósseis.
2X) O mercado de óleo e gás prevê um auge de exploração para daqui a 20, 30 anos. Como você vê o mundo até lá? Acredita que a utilização do petróleo terá diminuído?
Eu gostaria de dizer que sim, que nossa dependência do petróleo irá diminuir, e ainda existe esperança para isso, pois existem muitos grupos e empresas que caminham pelo lado verde, sustentável. Porém, infelizmente acredito que, cada vez mais, há uma competição pelo petróleo e a veiculação da imagem de que “não podemos viver sem” – o que distorce a realidade do potencial de outras tecnologias – mantém o mundo estagnado no mesmo cenário. Acho que a situação poderia mudar se todos se conscientizassem da existência de outras possibilidades, de que não é tão cara assim a implantação de tecnologias alternativas, e que poderíamos manter nossa qualidade de vida praticamente a mesma substituindo o petróleo por outras fontes de energia, com um pouco de trabalho duro e força de vontade. Resta saber se a população deseja sair da inércia e tentar melhorar a situação do nosso planeta, que em alguns anos se tornará insustentável.
3X) Na sua opinião, qual a melhor fonte de energia para se investir e por quê? O Brasil está no rumo certo quando se trata de eficiência energética?
Existem diversos tipos, mas, na minha opinião, as melhores fontes seriam as que necessitam de pouca ou nenhuma extração do ambiente, como a energia eólica, a hidrelétrica (em casos de locais com grandes correntezas de água ou cachoeiras), e, claro, a energia solar, que acho extremamente subutilizada. Acho que o Brasil tem investido no caminho certo, já temos implantadas diversas hidrelétricas há anos, existe cada vez mais uma maior preocupação com a “energia verde”, porém como um país com tanto potencial eólico e solar não investe mais nisso? Acho que ainda temos muito para avançar nesse quesito. Se houvesse maior investimento nessas tecnologias, o preço (que é a desculpa de muitos para não implantarem este tipo de fonte energética), cairia e as tecnologias se tornariam mais viáveis de serem implantadas.
4x) Que medidas as empresas que exploram petróleo podem tomar para serem ecologicamente corretas ou para reduzirem o impacto ambiental? É possível falar em sustentabilidade quando se trata de combustíveis fósseis?
Estudos prévios de impactos ambientais e análises de risco devem ser sempre realizados. Porém, esses estudos caem muitas vezes no jogo de corrupção onipresente no Brasil, onde se conclui que não haverá impacto ambiental nenhum, quando todos sabem que isso é extremamente difícil. Deve-se também sempre seguir à risca as leis e regulamentações estabelecidas, que existem por um motivo. Porém, aqui também temos o problema de corrupção, e as pessoas que querem apenas realizar seu trabalho são até ameaçadas para fazer as coisas “do jeitinho” que as empresas querem para obter as licitações desejadas. Estamos falando de um problema muito maior que não se restringe à exploração do petróleo, como, por exemplo, um estudo feito às pressas que acaba por permitir o vazamento de milhões de toneladas de óleo, ou então a queima e liberação de fumaça tóxica, em um projeto que deveria ser ecologicamente correto, e outras situações desse tipo.
Na minha opinião, estamos cavando um buraco, onde vamos nos enterrar em algumas décadas. O homem está tão dependente de petróleo que não quer pensar em outras soluções. Dou como exemplo o pré-sal aqui no Brasil. Quando foi descoberto, foi um acontecimento enorme, investem-se milhões, bilhões, de reais na sua extração. Porém, ele é um recurso finito. Por que não investir esse dinheiro em opções mais sustentáveis, como energia eólica ou solar? É claro que seria um investimento a longo prazo, para o desenvolvimento de tecnologias já existentes com objetivo de obter mais energia limpa com menos gasto de dinheiro. Infelizmente, as empresas pensam no agora, no retorno imediato que os combustíveis fósseis dão. Porém, o que não pensam é que, daqui a 40, 50 100 anos, o planeta que deixaremos para as próximas gerações estará esgotado de seus recursos finitos (inclusive água potável!) e será cada vez mais difícil e caro implantar tecnologias verdes. Por que não começar agora?
5X) Como foi a sua trajetória profissional e acadêmica? Já teve experiência na área de óleo e gás? E qual a sua expectativa como colunista do NNpetro?
Eu sou bióloga, formada pela UNIRIO e, quando terminei a graduação, descobri a vontade de ser pesquisadora, portanto resolvi fazer um mestrado na PUC-Rio. O mestrado foi em química analítica com foco ambiental, e eu tinha a vontade de trabalhar com compostos de importância atual no cenário brasileiro, por isso acabei trabalhando com os efeitos de hidrocarbonetos derivados de petróleo em organismos aquáticos, dentre outras linhas de pesquisa. Depois disso, continuei no doutorado, focando nos efeitos de metais pesados e alguns outros compostos em organismos aquáticos. Acho que a pesquisa abre muitas portas para diversas soluções a impactos danosos ao meio ambiente, se for bem conduzida.
Minha expectativa como colunista do NNpetro é poder compartilhar informações pouco difundidas, pois são informações científicas muitas vezes restritas a grupos como pesquisadores e acadêmicos. Além disso, eu também pretendo incitar discussões a respeito desse tipo de tema, pois é apenas com discussões que podemos chegar a medidas eficazes de prevenção a determinados problemas ambientais.

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